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sábado, 8 de março de 2014

ღ Capítulo 2 ღ

Tinham coisas que estavam me incomodando no trabalho, não era nada com ela. Mas aquela reação de chegar tão calada perto de mim e permanecer quieta  quando deitei no sofá com ela me garantiam que tinha sobrado pra ela minhas  preocupações.
Sai do banho e a cama estava arrumada, cheguei na cozinha ainda de toalha e o meu café estava na mesa, do jeito que ela sempre fazia, mas a caneca dela não estava, tampouco ela. Procurei na varanda, já que o apartamento é pequeno e da sala da pra ver tudo, e ela não estava. A mochila que fica pendurada do lado da estante não estava. Então reparei num bilhete que estava perto da minha câmera. Ela dizia que precisava ir e não tinha como esperar até eu sair do banho. Irritei-me. Gostava dela, mas uma coisa que eu não gostava nem um pouco era quando ela agia como criança, isso raramente acontecia, mas acontecia. Tomei meu café, me arrumei e então sai de casa. Percebi que a carona dela naquele dia eu não dei.
Cheguei na gravadora e a confusão já estava feita, tão cedo, e tão desgastante.
- Eu não o escolhi. – Gritava Lia.
- Mas tem que trabalhar com ele. – Gritava de volta o Logan.
- Não vou fazer meu trabalho com esse garoto, o estilo dele não me agrada, não me convence e não...
- Cala a boca, Lia. Você tem que fazer o trabalho que te foi imposto, se não quiser tudo bem, acerto as coisas com você mais tarde e você poderá trabalhar com alguém que você goste.
Eles me olhavam fixamente e eu revidava o olhar mostrando que paciência eu não tinha. Olhei o garoto que estava sentado no divã por trás da Lia. Ele estava realmente assustado. Empurrei a Lia da minha frente e falei ao garoto:
- Vem comigo, eu e ele – apontei pro Logan – é que vamos cuidar de você.
Ele levantou, pegou o violão e entrou pro estúdio comigo e o Logan logo atrás.
- Dave, espera. – A Lia agora calma me chamou – Me desculpa. Eu não ter agido desse jeito, é que não vejo espaço pra música dele aqui na gravadora. Eu não gosto desse estilo, sabe?
- Olha, aqui é trabalho e não casa de show que você pode escolher o que vai tocar. Aqui nós fazemos o trabalho como o cliente pede e manda. Se ele canta o estilo dele nada nós temos a ver, fazemos nosso serviço e pronto.
- Não se zanga comigo, estou vendo que a gravadora não anda tão bem quanto antes e por isso você anda tão preocupado.
- Dave, vamos? – O Logan me chamou.
- Depois a gente conversa, Lia.
Entrei e fiz meu trabalho como todos os dias, mas aquele em especial estava pesado e eu não estava me sentindo bem, em uma das pausas tentei ligar pra Savana mas não consegui. Na hora do almoço sai com Logan e com a Lia, estava mesmo na hora de conversarmos.
- Vamos aos fatos. A Gravadora está quebrada.
- Eu só queria saber o motivo de você ser tão pessimista, Lia.
-Mas ela está certa, Logan. Estamos quebrados. – Eu disse me jogando na cadeira.
- Não estar, Logan, e você sabe que não. Se vocês dois deixassem de ser cabeças duras e me ouvissem uma vez se quer, poderia ser importante. Entramos nessa juntos há dez anos e vocês raras vezes me ouvem, posso saber o motivo?
- Mas vai começar isso? – A Lia perguntou já começando a se exaltar.
- Lia, cala essa boca. Sua mania de querer gritar em toda conversa me dar nos nervos.
- Os dois já me mandaram calar a boca hoje, vão me bater?
A Lia era minha amiga mais antiga, a conhecia desde que tinha quatorze anos e ela doze, nunca foi uma adolescente convencional, talvez por isso que se deu tão bem comigo. Quando saímos do Arizona, ela com dezoito e eu com vinte, sabia que nossa vida em Nova Iorque não seria tão fácil. Tínhamos sonho de formarmos uma banda de rock e fazermos sucesso pelo mundo, mas o máximo que conseguimos com isso foi tocar em bares, conhecer o Logan um ano depois e depois de quatro anos montarmos nossa própria gravadora.
Estamos nessa há dez anos, mas a Lia nunca deixou de ser adolescente. Mesmo com trinta e três anos continuava com seus cabelos rosa e cara de seus vinte e pouco, o Logan por sua vez, era o empresário certinho de nós quatro. Havia quase seis meses que nosso negocio vinha caindo e não sabíamos que forma fazer para melhorar, e nas duas últimas semanas tivemos quase certeza que iriamos fechar as portas.
- Dave, porque a gente não faz o que o Logan disse?
- O que ele disse?
- Cara, acorda. – Eu realmente tinha me perdido por uns longos minutos.
- Eu disseque além das gravações poderíamos investir em outras coisas junto ao cd.
- Capa, divulgação, fotos. – Complementou a Lia.
- Não sei. Vocês acham que daria certo?
- Claro, porque não? – Falava a Lia animada.
- Acho que precisamos conversar mais sobre isso. – sorri animado depois de tanto tempo, e eles compreenderam como um sim.
Voltamos para a gravadora e passamos a tarde planejando e pesquisando o que e como poderíamos fazer, toda e qualquer ideia naquela hora seria bem vinda.
Passava das cinco da tarde e o Logan já tinha ido embora quando a Lia entrou no estúdio trazendo um café pra mim.
- A gente poderia incluir sua mulher nisso, ela não é fotografa?
- Não, a Savana não é minha mulher. E não, ela não é fotografa, ela estuda fotografia.
- Como não? Ela faz as fotos da Teen Fashion. – Revista adolescente que a Savana trabalhava há quase um ano.
- Sim, mas ela ainda não terminou a faculdade, então ainda não é fotografa.
- Certo, mas como não é sua mulher se mora com você há muito tempo?
- Ela fica comigo há uns meses, e como eu disse pra ela, ela é minha garota. Não é serio.
Sentia a respiração da Lia ficar forte, coisa que ela só faz quando estar com raiva. A olhei e estava certo, ela estava de cara fechada.
- Sabe, Dave. Quando eu comecei sair com o Brad e passei a dormir na casa dele, e tinha roupas minhas lá e eu dedicava meu tempo a ele e a casa e fazia tudo por ele, eu me tornei mulher dele. E se depois de tantos meses eu cuidando de tudo, fazendo de tudo e sendo mulher pra ele todas as noites ele me dissesse que eu era apenas a garota dele, eu o mandava para o inferno. E olha que eu nem sou tão novinha nem com cara de menina meiga que a Savana tem.
- Para com isso. Ela é madura, sabe bem como sou e ela não tem dessas coisas.
- Mentira sua, outro dia mesmo você disse que ela quase enlouqueceu quando você deu um bichinho de pelúcia pra ela. E, cara, eu nem sei como ela gosta tanto de você, não tem nada a ver um com o outro.
- Nos gostamos pelo oposto que somos.
- Frase pronta. Porque você permite que ela more lá?
- Ela não mora lá, ela só dorme comigo lá. Não temos nada certo, não é porque gosto dela e durmo com ela que ela é minha mulher...
- Dave...
- E para com essas coisas, ideia de que sou casado, não sou não, nem comprometido sou.
Levantei pra jogar meu copo na lixeira e Savana estava na porta segurando a mochila e mordendo o lábio, coisa que só a vi fazer uma vez, e quando ia chorar. Ela saiu depressa e eu sai atrás dela. Segurei o braço dela e ela me olhou com uma amargura nunca vista antes, suspirou e via lagrimas caírem do rosto dela. Se soltou e entrou num táxi.
Gritei pra Lia fechar tudo e subi na moto, mas lembrei da mochila, corri pra pegar e voltei pra moto. Fiz minha moto fingir que tinha asas até chegar em casa o mais depressa que pude. Cheguei em casa como louco chamando por ela, a porta estava fechada, abri nem sei bem como, e quando entrei a casa estava vazia, ela não estava, mas estava arrumada do jeito que ela fazia. Tentei ligar mas não consegui. Deitei no chão da sala, estava sentindo uma coisa estranha dentro de mim, achei que era devido o estresse do dia todo. Depois de muito tempo abri uma cerveja, tomei e dormi ali mesmo, no chão da sala.


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